O que são os “filtros” em Plataformas

Mecanismos que controlam a abundância gerada pelos modelos baseados em plataforma

O que são os “filtros” em Plataformas
Photo by Marcel Strauß / Unsplash

Uma plataforma é criada com três elementos: unidade de valor, plataforma tecnológica, interação entre as pontas.

Uma unidade de valor é o que o produtor cria para ser consumido pela pessoa/empresa do outro lado do processo. No caso do Uber a unidade de valor é a localização e a disponibilidade do motorista. No caso do Google, são as informações de sites  capturadas pelo crawler. No caso do Instagram, é a fotografia (agora é melhor falar conteúdo, dado que o Instagram está mais abrangente) que foi disponibilizada. No caso do Airbnb, o local. No caso da Sympla, a unidade de valor são as experiências disponibilizadas na plataforma. Do iFood, é a variedade de refeições (podemos ter uma discussão aqui se em vez de refeições não seria mais correto os restaurantes, mas deixemos para outra hora).

O valor de uma plataforma é percebida quando existe interações no topo da plataforma, ou seja, quando o usuário tem contato com as unidades de valor. Essas interações são criadas a partir do consumo dessas unidades de valor e daí vem a percepção do benefício.

Abundância leva a Irrelevância

É uma característica natural de negócios baseados em plataformas permitirem a criação de abundância de unidades de valor. Essa abundância pode ser maligna para a plataforma se não for controlada, levando à banalização de quem cria conteúdo e à irrelevância da oferta desse conteúdo perante o consumidor  (ainda não decidi se é melhor chamar a pessoa que usa o produto de cliente ou consumidor. Ultimamente estou incomodado com a palavra usuário, embora ache ela mais adequada.

Essa irrelevância acontece dos dois lados: produtor do valor e o consumidor do valor. Para o consumidor, as opções que são disponibilizadas podem não resolver o problema ou necessidade, além do paradigma de escolha. Para o produtor, o problema é a concorrência e a falta de fluxo de demanda.

Saber quais os restaurantes serão listados primeiro, listar quais vídeos ou resultados de buscas são mais relevantes, ou mostrar apenas os eventos que têm mais fit com o gosto das pessoas ou mostrar apenas os motoristas disponíveis na localização mais próxima é tarefa dos filtros disponíveis nos produtos/serviços.

A abundância não se resolve apenas fazendo uma curadoria minuciosa dos resultados, mas criando mecanismos sobre como, onde e pra quem mostrar cada unidade de valor disponibilizada na sua plataforma.

O que são filtros e como eles controlam a abundância

Para controlar essa abundância, nós criamos o que chamamos de filtros. Ao contrário do que você pode imaginar, filtros não são uma simples forma de ordenar ou criar uma camada de curadoria do conteúdo. Pense nos filtros como esteiras de entrega de valor, onde selecionamos exatamente o que, quando e para quem serão entregues as unidades de valor disponíveis na plataforma. Dessa forma, evitamos que o usuário tenha contato com unidades de valor irrelevantes disponíveis na plataforma para ele naquele momento.

No caso do Uber, o filtro é feito baseado na localização do passageiro e motorista. No caso do Google, o filtro mostra apenas os resultados relevantes baseado no termo buscado (e no histórico de comportamento da pessoa) . No caso do iFood, o filtro mostra os restaurantes que ficam próximos ou que entregam naquela região do comprador.

Filtros podem ser visualizados em diversos momentos da jornada do usuário, desde timelines até recomendações como “Quem comprou isso, comprou também”.  Há uma discussão interessante sobre como isso também se aplica à clientes B2B, que é um ambiente um pouco diferente de B2C, contudo, podemos trabalhar com permissionamentos ou até mesmo a quantidade de informações que fornecemos na interface.

Sinergia do benefício e dados

Plataformas bem sucedidas garantem que o valor seja entregue por meio de filtros bem estruturados em dois fatores:

  1. Garantia de que há bastante sinergia e fit entre o que o produtor cria e o que as pessoas procuram ou necessitam;
  2. Garantia de que a plataforma capture e use os dados gerados por meio do consumo das unidades de valor por meio do comportamento de uso dos filtros pelos usuários;

Dessa forma, é muito comum que as plataformas criem filtros que tenham um contexto de resultado cumulativo, ou seja, que usam o comportamento passado do usuário para elaborar melhores entregas de valor no futuro.

Os filtros então podem ser divididos em duas categorias:

  • Cumulativos ou,
  • Simples ou baseados em um momento específico no tempo;

Um exemplo fictício: se a busca do Google usasse apenas o termo buscado pelo usuário para mostrar os resultados, ele seria um filtro simples. Mas se além do tempo buscado, ele usa histórico de navegação, histórico de busca, comportamento anterior nos sites, histórico de visitas etc… esse filtro seria cumulativo, pois está somando dados anteriores para criar um contexto de resultado mais “relevante”.

Dessa forma você consegue, pelo menos em tese, remover todo o ruído criado pela abundância e purificando o valor entregue na ponta. Basicamente, quando falamos sobre personalização no nosso produto, seja de interface ou de resultados, estamos criando filtros cumulativos.

O dilema da relevância a partir da abundância

Contudo, quando criamos um filtro muito efetivo, ele contribui para a criação das famosas bolhas e vieses, iniciando toda aquela conversa sobre ética, controle e uso de dados comportamentais, geração de hábito por meio da manipulação de informações de uso etc.

O desafio aqui é criar relevância a partir da abundância, de forma que não filtremos tanto o conteúdo tornando-o totalmente parcial, mas que ainda tenha fit com o gosto das pessoas e traga realmente benefícios positivos percebidos pelas pessoas que usam a plataforma.

Isso quer dizer que os mecanismos que mantém esses filtros (timelines, recomendações, customizações, personalizações, e qualquer outro meio de entregar a informação - valor - para as pessoas) devem ser sempre revistos, de forma que mantenham a moderação entre relevância e manipulação. Não é que todas as redes sociais ou plataformas disponíveis sejam propositalmente más, desejando dominar a mente das pessoas. Algumas realmente procuram entregar um bom produto, que tragam benefícios para as pessoas, se focando no seu core value. Acontece que esses mecanismos tem um potencial muito grande de fazer estragos (como os que já estamos vendo) e por isso devem ser moderados.

Concluindo

Filtros são um formato comum e efetivo de levar conteúdo e facilitar/entregar/gerar valor para o consumidor, principalmente quando falamos de produtos e serviços que têm grande foco em B2C, mas isso também pode se aplicar, de acordo com cada contexto e cenário, à produtos e serviços B2B. O grande objetivo de um serviço baseado em plataformas, deve ser facilitar a interação entre as pontas da rede. Por isso a importância de foco nesses mecanismos, já que eles são uma das pontas mais claras e diretas de exposição e percepção de valor, permitindo gerenciar de forma consistente a orquestração das interações entre os atores e suas trocas na plataforma.

Referências:

Inscreva-se Product Oversee

Textos todas às quartas 7h45 na sua caixa de entrada.
faleconosco@productoversee.com
Inscreva-se